6 setembro 2018
De vez em quando salta a tampa da panela onde fervem os nossos complexos, quer os de superioridade, quer os de inferioridade, quer ainda os de igualdade. Como não temos muito por onde escolher para além do Futebol e de Fátima, matérias em que os ciganos não entram, quando a tampa salta, os complexos não ultrapassam por regra o debate da xenofobia e do racismo, com cada um a dizer que não é nada disso – são os outros, ou, são os que ninguém conhece. E neste debate, também por regra entra a questão dos ciganos, que na sua quase totalidade integram a categoria dos “outros”. O assunto varia de região para região e também conforme a época do ano. O mais recente e notado contributo para tal debate partiu de pessoa responsável do Governo a constatar que, sim senhor, em Portugal há xenofobia e racismo relativamente aos ciganos. Há ou não há?
Todos nós constatamos que nas escolas, hospitais e centros de saúde, filas de cidadãos, transportes públicos, etc., é muito difícil encontrar-se ciganos discriminados por razões de raça ou de etnia. São pessoas ao lado de outras, com os mesmos direitos e precedências, e de tal modo tolerados na convivência que poucos lhes exigem o cumprimento dos deveres que todos devem seguir. Sendo verdade também que se auto-excluem, que preferem viver à parte e com supostas regras próprias, que igualmente poucos contestam de forma direta, muito em particular no tratamento destinado a mulheres e crianças ciganas, e no que diz respeito à noção de propriedade de bens. Repreender um cigano que impõe o trabalho infantil, que agride uma mulher cigana por dá cá aquela palha, ou leva qualquer coisa que lhe fique debaixo de olho, é coisa que se evita, paradoxalmente para não se ser acusado, por complexo, de xenófobo e racista. Pensa-se, não se diz.
Particularmente no Algarve, nos meses em que os acampamentos por regra montados sem permissão, acompanham o número de roubos e assaltos, quase sempre implicando o comércio final dos frutos secos (alfarroba, figo e amêndoa), o medo de se ser tido como xenófobo e racista relativamente aos ciganos que circulam sem se saber de onde vieram e para onde se dirigem, leva a que se evite a acusação concreta e não se exija uma atuação preventiva por parte das autoridades. O que se diz e ouve quanto a ciganos, é o mesmo que se pode dizer e ouvir quanto a cidadãos que prevaricam. E assim engolimos a xenofobia e o racismo, de tal modo que a verdadeira pergunta a ser feita, não anda muito longe desta: que fazer ou de que integração podemos falar quando os ciganos nossos vizinhos são, eles mesmos, xenófobos e racistas, recusando deliberadamente a inclusão, a integração e a aceitação de deveres?
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Flagrante rescaldo: Pela chamada teoria do caos, “o bater de asas de uma borboleta em Tóquio pode provocar um furacão em Nova Iorque”. Pela mesma ordem de ideias, uma faúlha que destrua património no Algarve, pode provocar um incêndio num grande museu do Brasil. E já muita faúlha houve no património algarvio.