quinta-feira, 26 de abril de 2012

SMS 459. Saltitões

26 abril 2012

Para as eleições autárquicas, o quadro está quase desenhado: a limitação de mandatos vingou e resta agora saber se haverá listas únicas, ou se, como até aqui, listas separadas para câmaras e assembleias. Quanto à limitação de mandatos, se são razoavelmente compreensíveis as invocadas razões de prevenção ética, já não se compreende tão bem que essa limitação seja em função do território e não da pessoa. Um presidente de câmara deve ser, pelo senso comum, um conceituado da terra, sendo eleito pelo “conceito” que os eleitores locais têm dele, pelo que nem sempre é a bandeira do partido que conta, contando mais o perfil moral e de competência. Se um partido, grande ou pequeno, tem a sorte de contar com um candidato conceituado rodeado de um grupo também conceituado, é meio caminho andado, e a propaganda até será coisa secundária como para os sabonetes em que vale mais o cheiro que a eficácia. Se o candidato for conceituado, a propaganda não passa de festa dispendiosa e desnecessária na sua parte de feira de enganos. O que já não compreende é que um conceituado numa terra, impedido de se recandidatar por força da tal prevenção ética, possa continuar ou fazer carreira na terra ao lado, sabendo-se que os grupos de pressão que eventualmente contaminem a ética política ou que esse pessoal que não olha a meios para atingir fins, não está confinado aos territórios concelhios – tanto podem comprar a alma de um político na terra que naturalmente o elegeu com a podem comprar na terra contígua, onde, por vezes, até mais lhes convirá comprar a confiança de quem decide. E é assim que a lei sobre a limitação de mandatos, arrancando de uma boa intenção, pode vir a produzir diversos efeitos perversos. De um de tais efeitos perversos já não se livra – o de provocar uma nova figura de presidentes de câmara, a dos presidentes itinerantes ou saltitões. Para quê ou porquê a itinerância e o salto de uma terra para a outra? Apenas porque a lista de mordomias do partido não faculta um salto maior, seja para deputado, presidente disto ou diretor regional daquilo? Ou será que um indubitável conceituado numa terra se julga salvador do mundo e que, não podendo salvar o mundo todo, tendo salvado já uma terra - a sua terra -, se sente impelido à cruzada de salvar a terra contígua, fiado em que o santo vindo de fora é tido sempre como um salvador que faz milagres? Ou, mais elementar do que isso mas sem dúvida mais pernicioso, caso a presidência de câmara, como tudo leva a crer, se converter numa carreira de comissões eletivas de serviço em que o pudor, como nos juízes, obriga à conveniência de mudar de comarca, não quererá isso dizer que, afinal, o conceituado numa terra de origem mais não é mais do que capataz em potência na terra de arribação? Dos capatazes, fora da construção civil, não se tem bom conceito.

Sobre as listas, únicas ou separadas, fica para a semana.

Carlos Albino
________________
Flagrante advertência: Na hora de escolha dos nomes, cuidado com Isaltinos em potência, com Jardins à escala, e com os presunçosos da inocência. 

quinta-feira, 19 de abril de 2012

SMS 458. Retrato negro que não surpreende

19 abril 2012

Enfim, foi publicado o Índice Global de Desenvolvimento Regional em que o Algarve surge com um retrato negro. Os dados são de 2009 e, pelo que se sente à volta, a evolução foi certamente para pior. Uma região cujo desenvolvimento foi deixado ao acaso, entre o oportunismo desmedido e a improvisação enganosa, tinha que resultar nisso. O Estado não cumpriu o que devia ter cumprido – antes pelo contrário, tolerou que as formigas brancas se multiplicassem nos forros escondidos da burocracia, nem permitiu que a região se auto-responsabilizasse ou iniciasse sequer um aprendizado de escrutínio. E foi assim que muitos reinaram que se fartaram, eclipsando-se quando as coisas começaram a dar para o torto, deixando a região na penúria com as câmaras a fazerem contas com o impossível, com o índice de desemprego mais elevado do país, sem pescas, sem agricultura que se diga como tal, e totalmente dependente de um turismo a funcionar como lotaria ou jogo de sorte, cada vez mais a perder competitividade e que, operando na região, não tem rosto na região e muito menos carteira e coração. E, pior que tudo, tem estado a região desprovida de instituições que a poderiam orientar para a maioridade e, uma ou outra que tem não passa de verbo-de-encher, fazendo das tripas coração para sobrevivência. O Estado, que não permitiu até hoje uma réstia de regionalização, é por atos e omissões o primeiro grande responsável pela situação a que o Algarve chegou e talvez seja por isso que os rostos visíveis do Estado também fogem disto, não aguentando enfrentar os que tendo nascido ou vindo para aqui, vivendo e trabalhando aqui, sofrem as consequências dos erros e dos abusos sem nada terem podido fazer para os evitar.

Os dados do INE não surpreendem em nada quem tem estado atento à forma como a região tem sido tratada e como a si própria se tem tratado. É preciso ter andado ou andar muito distraído para esperar que apenas uns números de 2009, já largamente ultrapassados, lançassem alertas sobre a competitividade da região, sobre o panorama da coesão e sobre a qualidade ambiental. Avisos não faltaram, mas ou foram recebidos com desdém por quem os devia ter levado em conta, ou foram atirados para o cesto dos papéis por quem devia representar a região pela força do mandato e não em função de mera carreira pessoal.  Os visados não gostam, mas é assim.

Carlos Albino
________________
Flagrante prova: As portagens na Via do Infante tiveram, até hoje, uma grande vantagem – a de tornar evidente a quantidade e qualidade dos vira-casacas.

quinta-feira, 12 de abril de 2012

SMS 457. Tratados com os pés

12 abril 2012

Deixemo-nos de complicações. Nas auto-estradas concessionadas com portagens há a obrigação mínima de pré-sinalização dos custos, antes de se entrar no troço, para que o utilizador possa optar por alternativas e estas mesmas alternativas devem estar igualmente pré-sinalizadas com clareza. O utilizador tem o direito de saber e conhecer, através de tal sinalização, que está a entrar numa via paga ou que se vai colocar na linha de radar ou que se vai sujeitar à cobrança eletrónica. Isso não acontece para quem entre na Via do Infante. Por exemplo, quem venha de Lisboa para o Algarve pela A1 e, após o pórtico de Paderne, queira optar pela 125 rumo a Faro, não encontra qualquer sinalização do trajeto alternativo. Mais grave, é induzido em erro. Para se dirigir a Faro pela 125, não deve seguir a placa de Faro para nascente mas a de Albufeira/Portimão para poente… Só quem sabe é que dá essa volta para entrar na 125 porque quem não sabe, segue a placa e sujeita-se à cobrança eletrónica sem alternativa. O dever legal de informar o utilizador e que corresponde a um direito deste, não está a ser cumprido. O utilizador é tratado como um objeto, tratado com os pés. Esta não é uma questão de consideração pelo utilizador, é um incumprimento e, no exemplo dado, um caso de engano do utilizador. Creio que se o dever legal de informar com clareza não está a ser cumprido, também não haverá a obrigação de pagar sendo enganado e se os casos de recusa de pagamento por falta de informação de quem a deve prestar subirem aos tribunais, divido que haja juiz que condene porque a lei é só uma para quem cobra e para quem é cobrado.

O ministro Álvaro Santos Pereira que, em última análise gere esta brincadeira, com todos os seus anos de Canadá, deve certamente saber que nesse país um ministro que tutele os transportes, se por acaso é apanhado a circular a mais de 110 milhas, ele não tem outra alternativa que não seja a de se demitir por essa simples infração, como aconteceu. Os canadianos não admitiriam um ministro seu a não cumprir a lei, como não admitiriam pagar portagens sem informação prévia e atempada para escolha de trajeto alternativo, escolha essa que é um direito do utilizador. Mas, segundo parece, as boas lições que o Canadá dá, e são muitas, são rapidamente esquecidas por quem chega aos cadeirões da chafarica e, em vez de tratar os utilizadores com consideração, os trata com os pés enquanto expõe geniais teorias sobre o pastel de nata. Assim, não admira nada o quem acontece na fronteira com os turistas que vem na mesma linha da forma como são tratados à chegada no aeroporto de Faro. Tratados com os pés. O ministro deve ler jornais e, se não lê, tem seguramente um regimento de assessores que lhe fazem a síntese dos recortes pelo que escusa de culpar subalternos. Geriu mal e está a gerir mal este assunto e, fosse ele ministro canadiano, não aguentaria um dia. Só que em Portugal é diferente, aguenta-se uma eternidade desde que se tenha um rei na barriga, que é o que mais há por aí de alto a baixo. Deixemo-nos de complicações porque sabemos o que a casa gasta.

Carlos Albino
________________
Flagrante solução: Desculpe António Pina, mas bem pode colocar a nau Boa Esperança na prospeção de gás e petróleo. Não há melhor do que aquilo  para fazer um furo.

quinta-feira, 5 de abril de 2012

SMS 456. Que símbolo tem a região?

5 abril 2012

Símbolo político, claro, não falemos de outros símbolos que não se percebe muito bem a razão porque caíram em desuso a troco de uma chaminé da Mealhada. Quando havia governador civil, o símbolo era esse muito embora sem peso e correspondendo a uma figura faz de conta. Agora nem isso há. A AMAL não deixou de ser uma corporação de municípios – grémio, se a sua maioria está em sintonia com o governo, sindicato se eventualmente ganha a cor da oposição. Além disso, vai sendo o que os decretos de Lisboa determinam:  nascida em 1992 como associação, convencida como Grande Área Metropolitana em 2004  e convertida em Comunidade Intermunicipal em 2008. Conforme o governo, assim a AMAL belisca ou vai na procissão, e quer nos beliscões ou na procissão, não lhe tem custado nada dar o dito pelo não dito, consoante a conveniência. Não é símbolo político do Algarve porque também não conduz ao reconhecimento do que é o Algarve e do que o Algarve possa sentir. Quando muito é um caleidoscópio de autarquias, agita-se e as cores são sempre as mesmas embora as figuras geométricas sejam diferentes em função das eleições autárquicas ou legislativas. Fora disso, há a Comissão que, como comissão que é, é dirigida por um comissário e não mais que isso. Longe também de ser um símbolo de poder político, poder no sentido de voz com força moral e que se faça ouvir em Lisboa quando for necessário e justificável ou que os algarvios reclamem. É claro também que temos por aí uma direções regionais que apenas são notadas nos dias de festa pela frota de carros estacionados ou nos dias de trabalho pela aplicação de medidas, pela distribuição de subsídios e compensações cada vez menos e por uns pareceres que ora parecem ora desaparecem. Tomara estas terem funcionários zelosos porque a sua função não é a de serem símbolos políticos. Restam os deputados de quem já muito temos falado, os quais, salvo honrosas exceções, tomara eles também usufruírem dos prazeres da legislatura. Ou condicionados pela disciplina partidária, ou tolhidos pela agenda igualmente partidária, no seu todo não se lhes nota que sejam a voz plural da região, com tal autoridade no fórum parlamentar que, antes de abrirem a boca. se ouça nas bancadas -  “Atenção ao assunto que é o deputado do Algarve que vai falar!”

Carlos Albino
________________
Flagrante conveniência: A da Associação do Comércio e Serviços da Região do Algarve (ACRAL) tirar isso a limpo e rapidamente, porque é a imagem da região que está em causa. É um espetáculo nada digno.