quinta-feira, 23 de fevereiro de 2012

SMS 451. Ele tem razão, carradas de razão

23 fevereiro 2012

Os números aí chegaram com brutal frieza: o Algarve foi a região portuguesa com maior taxa de desemprego no último trimestre de 2011, além de, em função dos valores médios para o total do ano passado, o Algarve surgir também, com 15,6%. a região, com a taxa de desemprego mais elevada do País. Os dados do Instituto de Estatística são calamitosos e dos deputados não se ouviu (de alguns ainda assim) mais do que chorarem sobre o leite derramado, nem dos chefes de estruturas se ouviu uma mosca. Quem ergueu a voz, voz que se ouvisse, foi Elidérico Viegas, dirigente da principal associação hoteleira algarvia. O resto ficou a olhar para a janela e para o lado, como o maquinista do Intrercidades à espera do apito do chefe de estação.

Elidérico Viegas tem razão, carradas de razão, ao referir com clareza e sem subterfúgios, que, para além das causas imediatas do desemprego (descida das taxas de ocupação dos estabelecimentos hoteleiros e diminuição das receitas da atividade de longe dominante no Algarve) a falta de competitividade do Turismo é um mal de raiz cujos causas são a queda da procura e a dificuldade em competir com destinos concorrentes, designadamente Espanha, Turquia e países do Magrebe. E, embora não falando da qualidade dos serviços, acrescentou que não são os preços o busílis da questão mas sim outros fatores, exemplificando com os impostos e com as taxas aeroportuárias que são as mais elevadas da Europa, acrescentando nós que, se assim é, será mais um mealheiro pacóvio a juntar ao pacóvio mealheiro da A22 que estoirou ou está a estoirar os planos das pequenas empresas que resistem e dependem da mobilidade. E quanto ao chamado turismo interno, resumiu em duas penadas: os cidadãos nacionais viajam para o Algarve pura e simplesmente para ficarem em casa. Ou seja: não contam. Quando poderiam e deveriam contar.

É claro que sobre a ação sócio-cultural e sobre a promoção do turismo algarvio para efeitos deste turismo interno, o que haveria ou há para dizer daria um tratado e não cabe aqui. Mas ainda assim se diz que os grandes meios de comunicação e estruturas públicas determinantes, todos eles ancorados lá em cima, mais não têm feito que a delapidação da imagem do Algarve, por omissão e desvio de atenções, e de forma direta ou indireta mais não se exercitam que a desencorajar o Algarve como destino turístico – turístico, e não meramente de regabofe ou, noutros casos, de semi-executivos dormideiros que para aqui vêm com calções às florinhas.

Para emendar isto, seria necessário coragem e vontade política. A coragem política acaba no Caldeirão e a vontade não é coisa que se exija a filipes ou seja de esperar de filipes. Nisto, os algarvios são responsáveis mas essa é outra história.

Carlos Albino
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Flagrante promoção: Mais fez a Volta ao Algarve que em quatro dias na promoção mundial da região faz o que a RTP em 50 e tal anos não fez, e não foi necessário desaparecer uma criança inglesa.

quinta-feira, 16 de fevereiro de 2012

SMS 450. Senhora Merkel, venha cá!

16 fevereiro 2012

Pelos maus motivos conhecidos, Alberto João Jardim antecipou-se-nos mas não é lá por isso que, pelos bons motivos, devamos pôr de lado o convite à chanceler alemã para visitar o Algarve e ver com os seus próprios olhos como somos exemplo a seguir na aplicação dos generosos dinheiros europeus. Jardim convidou Ângela Merkel para verificar que na Madeira o regabofe não foi assim tanto como dizem. Quanto a nós, nada disso, antes pelo contrário o convite destina-se a que a chanceler certifique o bom exemplo que o estóico e civilizado Algarve é. Senão vejamos, com dois exemplos.

Construiu-se, em grande parte com dinheiros da Europa a fundo perdido, a única via rápida da região que era para ser de três faixas mas foi alargada para quatro para ter a fama de auto-estrada, mas apesar disso foram introduzidas portagens para lucro do Estado e intermediários no que é verdadeiro mealheiro. Não é este um bom exemplo de boa aplicação de fundos estruturais? Além disso, ao longo de anos e anos, foi prometida a chamada requalificação do ziguezague do século XIX que, no século XX recebeu primeiro a designação de Estrada Nacional 125 que de nacional nada tinha, e já no último quartel haveria de se chamar “estrada da morte”, pois em cada curva e em cada lomba a meio de cada pequena reta com casas de habitação e de comércio a cada lado, lá está a memória de incontáveis mortos ceifados no melhor da vida, mesmo com a célebre tolerância zero na circulação a 50 Kms à hora e correspondente caça à multa, porque aquilo é só caçar. Houve, na verdade, aqui e além uns arremedos de requalificação que mais não são do que muros de Berlim separando gentes e haveres, e, exemplo do horror, emparedando por exemplo o Centro Cultural de São Lourenço ditando a extinção deste, como cedo se tornou óbvio. Não se chama a isto uma boa aplicação dos fundos estruturais? Senhora Merkel, venha cá ver os bons exemplos de um Algarve nada perdulário.

Mas há outro exemplo. Pela engenharia estatística, tirada a média dos apreciáveis lucros do turismo e afins (em grande parte com código postal em paraísos fiscais) e dos magros lucros dos pobres algarvios, concluiu-se que a região é rica a ponto de perder acesso a fundos europeus destinados a áreas deprimidas. A verdade é que os algarvios continuam deprimidos mas os que para isso contribuíram parece que não. Mas com cara alegre, elegendo deputados que quando deputam não delegam e quando delegam não deputam, com muita ginástica de rins dos municípios (senhora Merkel, não se esqueça de ir a Alcoutim, por exemplo), e com santa paciência face aos emissários do centralismo regra geral opulento e sobranceiro no uso da sua arma predileta que é a burocracia, o Algarve suporta essa fama de rico, sendo pobre, assimétrico, desprovido e para o qual o Orçamento de Estado é sistematicamente mau padrasto, sem que, apesar de tudo isso, o Algarve reclame da Europa o que a Europa lhe deveria dar sem favores mas por retorno (a lista dos que aqui bebem é conhecida).

Senhora Merkel, venha cá.

Carlos Albino
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Flagrante errata: E logo com a Universidade. No apontamento da semana passada deixou-se sugerido que a Universidade do Algarve deveria ter avaliado o programa Allgarve sem esperar pela encomenda mas por motu próprio.  Por razões alheias, em vez de motu saiu moto, gralha suficiente para se perder graduação honoris causa, a avaliar pelo telefonema de reparo. Nada de gralhas com a universidade.

quinta-feira, 9 de fevereiro de 2012

SMS 449. A palavra de título está no fim

9 fevereiro 2012

Consta que algumas câmaras municipais e juntas de freguesia estão a cancelar assinaturas dos poucos jornais locais e regionais que o Algarve ainda tem sem barriga de aluguer, alegando a crise. Somados os locais aos regionais, quando muito serão uns cinco ou seis jornais para cada câmara e na generalidade um ou dois jornais para cada junta, custando isso uns 120 euros anuais no máximo. É claro que os jornais estão a ser postos de lado pelos autarcas não é pelos 120 euros para 365 dias, nem porque a prosa geralmente laudatória que se lhes destina os fere na cultivada virtude da humildade, e muito menos porque a crítica feroz e impiedosa dos jornais algarvios perante questões esquisitas tenha feito cair meia centena de juntas e dúzia e meia de câmaras a ponto de se justificar tal corretivo. A coisa é mais simples – o pessoal decisor das câmaras e juntas que corta nos jornais, corta porque não lê jornais, e caso um ou outro jornal publique alguma coisa que o toque, lêem-nos pela fotocópia, ou não seja verdade que a fotocópia se tornou na mãe de toda a política portuguesa, incluindo a política local que é a fotocópia da nacional. Mas a juntar aos tais cortes de assinaturas por câmaras e juntas, chegam notícias de calotes de algumas bibliotecas também municipais pelos jornais e revistas que adquirem para as salas de leitura forçando jornaleiros a andarem de Anás para Caifás, com cada Anás a enxotar a água do capote para outro Caifás. As verbas também não são por aí além, mas não é de admirar que, mais dia menos dia, os jornais sejam retirados das bibliotecas devido à crise, ou não seja verdade que a crise se tornou na desculpa useira e pretexto vezeiro para tapar erros de gestão, para dissimular analfabetismos reinantes e para salvar incompetências atrozes. Quando um presidente de câmara invoca que não tem 40 euros para pagar uma assinatura de jornal que diz diretamente respeito à terra, e quando um diretor de biblioteca, mês após mês, levanta jornais e revistas sem pagar dizendo que não sabe quem pode e deve pagar, isso tem um nome que é muito feio e que por acaso foi das primeiras palavras que a estrangeirada da troika aprendeu de português. Que palavra? Mesquinhez. Até dá vergonha pôr a palavra em título.

Carlos Albino
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Flagrante encomenda: Então foi preciso encomendar um estudo para a Universidade do Algarve avaliar o tal programa Allgarve? Isso não era coisa para uma universidade avaliar por motu proprio?

quinta-feira, 2 de fevereiro de 2012

SMS 448. Presentes envenenados

2 fevereiro 2012

Há que desconfiar, melhor, há fundamentos para desconfiar. Talvez para testar recetividades, foram atiradas ao ar pelos fogueteiros de confiança, algumas notícias que à primeira vista parecerão boas mas há que desconfiar. Foram os casos da reposição das regiões de turismo, da promoção das comunidades intermunicipais a “supermunicípios” invocadamente como caminho para a regionalização, e, dizendo mais diretamente respeito ao Algarve, o fim do Allgarve. Aparentemente boas notícias mas as dúvidas são muitas sobre se não serão presentes envenenados. Quanto às regiões de turismo, não é difícil prever que a solução equivale a criar uns tantos maus da fita sobre cujos ombros recairão as consequências dos cortes orçamentais e dos apertos de toada a ordem – não será bem o caminho para a gestão autónoma dos interesses mas sim mais uns lugares para capatazes subservientes para cima e a encolher os ombros para baixo. Quanto aos “supermunicípios”, promoção essa à custa das competências dos municípios e não do poder central, isso assemelha-se à promoção de sargentos-ajudantes a capitães sem passarem por tenentes – como será extremamente complicado extinguir no Algarve quanto ou cinco municípios que sejam, extinguem-se os 16 numa rajada. E quanto ao Allgarve, uma coisa é corrigir a designação e reorientar o programa para uma zona onde Turismo e Cultura sejam sinónimos e não negociata de eventos, outra é acabar com tudo e dar lugar a festas do mais reles provincianismo, sem nível e mostruário de estrelas pífias. Há que desconfiar de tais presentes. Depois de anos em que o turismo central deixou cair da primeira linha a experiência da antiga RTA, não será nos tempos que correm que o Estado vai investir a sério na organização regional da atividade. E quando o governo envia mensageiros a avisar que quanto a regionalização, os algarvios que rirem os cavalinhos da chuva, também é difícil admitir que tais mensageiros sejam desautorizados depois do serviço prestado, aparentemente com o povo serenado.  Finalmente, quanto ao Allgarve, deixemo-nos de histórias, temos Guimarães para a cultura e basta, que a coisa não sai barata, até porque, para além dos artistas, têm que pagar os espetadores para as plateias do berço nacional não ficarem vazias e entediadas com tanta presunção.

Carlos Albino
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Flagrante previsão: Pois claro que o tráfego da Via do Infante caiu para metade, o que quer dizer que o da 125 dobrou fazendo da política de transportes no Algarve uma lástima. Pouco falta para que o melhor comunicação entre Lagos e Faro e entre Tavira e Portimão seja por via marítima. Entreguem a política a guarda-livros e vão ver os resultados de caixa.