quinta-feira, 27 de outubro de 2011

SMS 434. Pois que mais vida haverá?


27 outubro 2011

O conhecido governante por aí se desdobrou a dizer que há vida para além da austeridade ou além do Orçamento. Se ele se referia à vida no outro mundo, enfim, cada um tem legitimidade para acreditar no que entender. Se ele se referia à vida neste mundo e da qual apenas fugimos por razões alheias à nossa vontade, isso deve ter sido brincadeira ou infantilidade. O país enfrenta um recorde de défice e uma dívida pública insustentável a garrotar o crescimento e a asfixiar o emprego, e não vive isolado numa crise – ela é deveras vasta, incide desta ou daquela forma em todos os países colocados durante décadas na prateleira dos desenvolvidos e ameaça alastrar aos chamados países emergentes cujo êxito tem sido muito à conta dos maiores atropelos a direitos fundamentais do ser humano para obter trabalho barato e engenheirar economias competitivas, tão competitivas que provocaram esse fenómeno incontornável da deslocalização de empresas dos mais desenvolvidos para os menos. Portugal quer exportar mais, e é bom que o faça, e importar menos, sendo também razoável que também o faça no muito que é desnecessário e prejudica a produção interna, mas como a nossa crise não é só nossa, é sobretudo dos outros e em grande parte por causa de alguns outros, os outros também querem exportar mais e importar menos… O mesmo com a captação de investimentos, com o turismo, por aí fora – se nós, em crise, queremos crescer, os outros também querem, pelo que ou impera a abominável lei do mais forte ou se acendem conflitos que, como todos os conflitos, começam por rastilhos de que nem sempre nos apercebemos e até menosprezamos. Ou seja: estamos metidos num imbróglio de todo o tamanho, e quando isso acontece ou se prevê que esteja para acontecer (o governo anterior desdenhou avisos e advertências), o mínimo que se exige a um governo é que não tenha brincalhões. É que não há vida fora da prosperidade ou fora da austeridade.

Carlos Albino
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Flagrante evidência: Quanto às freguesias, se decretarem, o que podem fazer? Nada. E nada porque alguma força que por aí se simula mais não é do que localismo exacerbado e isso não é força – é incapacidade de argumentação.

quinta-feira, 20 de outubro de 2011

SMS 433. O poder do lobby

20 outubro 2011

O ministro da Economia, Álvaro Santos Pereira, não veio ao Algarve garantir a requalificação da 125 desta ou daquela maneira, agora já ou daqui a instantes, nem veio a Faro prometer a correção da miserável linha ferroviária com estações onde deveriam estar, conservando-se exatamente como nos tempos em que era alternativa ao carro de burro. Mas foi a Viseu prometer a auto-estrada para Coimbra e, embora mais tarde mas nesta legislatura, a linha de comboio para a mesma cidade. Na sala, entre os que ouviam o ministro, estava o presidente da assembleia municipal de Viseu, Almeida Henriques de seu nome, e que por mero mas indisfarçável acaso, muito mero acaso, é também o secretário de Estado Adjunto da Economia e do Desenvolvimento Regional, trabalhando pois ao lado do ministro e com as delegações deste, pelo que aquilo que estava a ouvir não seria assim uma grande novidade. O lobby de Viseu estava ali sem qualquer disfarce, numa reunião partidária, com certeza, mas o que foi dito foi para Viseu ouvir, tomar conhecimentoe ganhar alento.

Naturalmente que só é de saudar Viseu pelo que consegue tal como é de saudar o Oeste (Leiria, Caldas) pelo que também conseguiu e vai conseguindo, o Algarve não deve invejar nem tem que invejar, mas é lícito que se interrogue sobre o poder dos lobhbies e sobre como as decisões políticas de exceção são feitas na sequência de lobbying, que é coisa que o Algarve não faz e que desde sempre não tem tido capacidade de fazer, por dois motivos. Primeiro motivo, é que quem poderia fazer lobbying (deputados influentes ou alguns raros admitidos em governos) cuidam mas é das suas vidinhas, até evitam assumir-se como algarvios a não ser cá em baixo para provocar uns circunstanciais aplausos dos provincianos e uns títulos na imprensa regional, como sempre acrítica e reverente. Segundo motivo, é que para haver lobbying por quem o possa fazer, a região tem que ter força moral como região, força política endossada pelas instituições que possua e sobretudo poder económico e financeiro. Nada disto o Algarve desgraçadamente tem porque não são uns verbos de encher que conferem tal força – a força moral da região nem chega ao Caldeirão com medo da travessia, a força política termina nestas direções regionais que na sua maior parte são sinecuras ou manifestos exemplares de gente que engoliu garfos - tem havido exceções mas porque são precisamente exceções, os governos também se têm encarregado de apear tais incomodidades. E quanto a força económica e financeira, ela está toda, na sua parte útil e operativa, fora da região – aqui nem molha os pés.

O Algarve fica para trás, neste jogo de lobbying que não é nada bonito, aliás é mesmo muito feio no pino desta crise sem precedentes.

Carlos Albino
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Flagrante impreparação: Há ministros deste governo, decisivos nos dinheiros, que desconhecem que cidades algarvias aparecem nas estatísticas com escassos milhares de habitantes mas que, por três a quatro meses, são literalmente ocupadas e usadas por centenas de milhares… E cortam como se tais cidades estivessem no deserto. Ou vieram do outro mundo, ou não passam de uns caloiros da governação.

quinta-feira, 13 de outubro de 2011

SMS 432. E assim a isto se chegou

13 outubro 2011

Há um ano ninguém queria acreditar e mesmo os que com isto ameaçavam por efeito dos calores da política, faziam-no vagamente convencidos ou esperançados que a tempestade passaria ao largo. E tão convencidos estavam de que isto era mais um jogo, que não tomaram providências na região, referindo-me às autarquias que há muito deviam ter preparado a casa para o pior que aí está – o governo de há um ano, esse já lá vai e o eleitorado avaliou-o na devida altura com a punição que se sabe. Continuou-se a gastar, sobretudo em muito de supérfluo, como se nada estivesse para acontecer, e em grande parte continuou-se a gastar por responsabilidade e inconsciência de muitos funcionários. E querem exemplos? Começa logo pelos veículos. Em Londres, os ministros vão a pé, de bicicleta ou de táxi para os seus ministérios; em Madrid foram tomadas medidas que apontam nesse sentido e em Lisboa o uso dos carros oficiais já é de mau tom fora das questões oficiais que é a fórmula portuguesa de contornar... Mas, vá lá, em Lisboa, além de apanhar um táxi seria sempre uma boa desculpa para chegar uma hora atrasado a tudo, ainda se entende que um ministro não vá a pé de Cascais, de Loures ou de Sintra onde possa morar que, à escala do Algarve seria o mesmo que calcorrear de Portimão até Faro.  O que não se entende é que no Algarve, escassos 100 ou 200 metros tenham que ser em carro oficial, ou mais grave, no caso dos chefes que são mais que os índios, em carro de serviço. É apenas um exemplo. Serve apenas para dar nota de que a consciência do que a crise é e do que a crise implica, surge tardiamente e apenas quando se fazem os cálculos para o próximo ano com base na situação presente que era esperada – as autarquias estão sem dinheiro e sem perspetivas de dinheiro. Sabia-se isso pelo que teria sido melhor poupar durante um ano com um terço dessas lâmpadas que estão nos descampados sem casas apenas para exibir a “grandeza urbanística” de nada, do que deixar-se agora as terras habitadas às escuras durante horas. Ou, em metáfora regional, que em vez de tanto fogo de artifício de cada um no seu quintal contíguo ao outro quintal, se tivesse feito apenas um, dois ou quando muito três exercícios de fogo preso que eram os suficientes para serem vistos do Algarve todo. Metáfora apenas, mas já é tarde.

Carlos Albino
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Flagrante presente envenenado: A Via do Infante que foi o maior presente envenenado oferecido à região.

quinta-feira, 6 de outubro de 2011

SMS 431. D. Sebastião e o cardeal D. Henrique

6 outubro 2011

Foi um balde de água fria? Não foi. O facto do PSD ter colocado no Programa de Governo a criação de regiões-piloto, levou a que muitos tivessem pensado que vai ser agora, porquanto o PS não se oporá, o PCP não criará obstáculos, o BE irá na onda e quando muito o CDS colocará reservas., mas que, feitas as contas, a ideia terá pernas para andar. Mais uma vez se pensou que uma região, ainda que piloto, cai do céu, bastará um toque na lei fundamental, um decreto. E então, com o secretário de Estado Marco António á frente, ele que tem sido inegável campeão da regionalização, a pergunta era de lhe ser feita, o que aconteceu no recente debate em Vila Real de Santo António.  E a resposta só pode ter sido um balde água fria para os que se acomodaram à ideia de que para a criação da Região do Algarve, ainda que experimental, bastará o milagre supostamente fácil de quem legisla e de quem governa, sem mais, ou seja, sem que a região candidata a Região mexa uma palha, se organize civilmente, se movimente civicamente, sem que crie fóruns abrangentes onde o provincianismo fique à porta e sem a sociedade mostre que tem lideranças credíveis, com peso no País ou perante o País, que tem força própria, elevada, mobilizada e mobilizadora, e com autoridade moral, cultural, política e cívica – sobretudo cívica, que é o mais importante e não depende de decreto, nem de programas de governo. Para quem, por honestidade intelectual, reconheça que o Algarve não tem este acervo – tem fogachos, tem voluntarismos, sérios sem dúvida, mas apenas voluntarismos - a resposta de Marco António não foi um balde de água fria e a invocação do decálogo da troika foi mero pretexto, mero pretexto. Que respondeu Marco António? Depois de tribunar que a regionalização não é uma prioridade havendo que “perceber o que é essencial e o que se pode tornar acessório” em função do “cronograma e valores definidos” pela troika, ele foi direto ao assunto e gravou o epitáfio: “Não há tempo, nem momento, nem oportunidade para abrir um debate sobre a regionalização”. Mas qual debate? O debate político envolvendo poder legislativo e executivo, ou o debate oriundo da sociedade interessada? Marco António certamente ao responder aquilo não desconhecia que esses dois debates coincidem na inviabilidade de um com a inexistência do outro. Politicamente, o decálogo da troika dá o excelente pretexto; civicamente, a sociedade algarvia tem vozes mas não tem voz, é rica de voluntarismos mas não dá mostras de vontade coletiva, invoca a pretensão da região por conveniência e conforme a conveniência dos sultanatos autárquicos mas não tem movimento consolidado, plural, com caderno, com endereço. E, desculpem lá, a crise na construção civil é enorme, mas não são esses andaimes que dão força à reclamação da região, piloto que seja ela. O PS já provou que, afinal, não tem nenhum D. Sebastião e o PSD está a provar que não passa do cardeal D. Henrique, sem que com rigor se responda à pergunta: O que é o Algarve? Um conjunto de sultanatos? E isso basta?

Carlos Albino
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Flagrantes produtos portugueses: No hipermercado, água espanhola comercializada por empresa suíça… Ao menos a água!